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quarta-feira, 14 de julho de 2010

política é bom e eu gosto



Política não é careta, nem coisa de picareta. Existem caretas e picaretas na política, assim como em qualquer ramo de atividade e campo do conhecimento humano.

Nasci em 1978, próximo à anistia do Geisel, aos 6 levantava a cabeça para observar nas faces dos adultos a euforia seguida de desencanto em relação às Diretas; com 10 anos me lembro do velho Ullysses, a quem meu pai respeitava como um sábio monge, sendo aplaudido com um livro em punhos, e em cuja capa havia um desenho engraçado da bandeira pela metade.

Quando o presidente-jet ski – eu adorava suas peripécias – desceu a rampa com aquela cara de “a história me absolverá”, segurava a mão de sua inseparável namorada, morria de pena deles, contava eu 14 anos. Bom, a história não o absolveu, mas o povo alagoano sim...

Aos 20, ainda leitor de Veja e recém saído de um colégio católico e fascista, me prendeu na TV a imagem de tensão do Pedro Malan durante uma quebradeira brasileira no início do segundo governo FHC, sobre o qual dizia eu a todos em 1993 ser muito mais preparado que o Lula. Chegava a repetir durante o recreio: “é a mesma coisa de eu (aos 15) querer entrar na faculdade”.

Algum tempo depois, através do rádio de um carro com as portas escancaradas, no meio de uma multidão no centro do Recife, chorei durante o primeiro pronunciamento do Lula eleito, prometendo como primeira medida acabar com a fome dos brasileiros. Já estava cabeludo, descolado e metido na política estudantil, 24 anos.

Agora aos 31, vendo finalmente o Serra sorrir ao ser fotografado, fui almoçar com um colega de trabalho e nos caiu justamente essa ficha aparentemente óbvia, mas imbuída de um valor urgente de tuitagem: desde que nasci a grande mídia me tenta demonstrar através de fontes infalíveis e fatos incontestáveis que a política não presta, e que, portanto, não serve para as pessoas que tentam se manter na linha: os que não sonegam, não atrasam o boleto do cartão de crédito e não roubam vaga de estacionamento de shopping. O sentimento que paira é justamente o contrário, ai de nós pensarmos em atuar politicamente, afinal de contas, onde estaríamos querendo chegar?

Do síndico do prédio ao presidente da república, ninguém escapa à desconfiança de ter almejado um cargo político. Muitos nem cogitam a possibilidade de atuar politicamente, apesar de alguns terem o maior talento pra coisa, por temerem a chegada do inevitável dia em que se sujarão, se venderão, pois pensando bem, para o senso comum, é impossível governar sem se aliar aos poderosos, sem cantar parabéns, comer do bolo e ainda ter que apagar as velinhas. No entanto é sempre bom ter cuidado com idéias queijo-queijo, principalmente as mais obviamente corretas.

Que tal perguntarmos o porquê de nos embutirem tanto medo em relação a uma atividade tão essencial, diria imprescindível, ao Estado Democrático de Direito numa jovem República federalista e presidencialista como o Brasil? Seria uma maneira de cuidado da imprensa perante o cidadão brasileiro? Uma tentativa de aviso ao inocente, que por um descuido emocional democrático-republicano possa vir a se tornar cego em relação às agruras que um posto público comporta? A selvagem disputa de poder, a possibilidade desse mesmo cidadão ser coagido por malfeitores e exposto a denúncias falsas de corrupção... Ou seria o alcance de um objetivo, já bastante camuflado, de cada vez mais afastar as perspectivas de formação de um Estado, uma tentativa de desestimular os jovens a lutarem por algo chamado política pública? Até porque denúncia de corrupção não é nenhuma novidade da Era Collor, vide “As Vespas” e “Os Acarnenses”, peças teatrais de Aristófanes na (longíqua?) Atenas do século X aC.

Parece às vezes muito óbvio (ou não) que milionários grupos corporativos nacionais e estrangeiros que controlam a grande imprensa brasileira insistem em algumas “verdades”, lembro-me rapidamente de duas delas. A primeira, a de que tudo que seja público cheira à incapacidade, saúde, educação e outros setores públicos não prestam, são horripilantes, uma vergonha e não funcionam. Outra: nós brasileiros gastamos muito com impostos, somos indevidamente taxados, e essa dinheirama não é bem administrada, pois o aparato público-burocrático é ineficiente e possui enormes brechas para a prática da corrupção.

O que se poderia pensar como conclusão de afirmativas tão aparentemente óbvias? Vale muito à pena privatizar esses setores, diminuir a um patamar simbólico o poder do Estado, o que se seguiria uma severa diminuição de impostos e uma campanha de conscientização em massa para que o brasileiro alcance e incorpore um espírito liberal, empreendedor, de liderança, almejando sempre o top do que pode ser chamado, nesse caso, de céu: sucesso-riqueza.

O problema é que nem tudo é verdade no que diz respeito tanto à ineficiência dos setores públicos, quanto da injusta taxação de impostos no Brasil. No público, há os considerados centros de excelência, vide Fiocruz, USP, Unifesp, INCA etc. Concordo que a excelência precisa ser expandida, precisa ser desencastelada, concordo também que muitos setores públicos estão muito longe do que possamos entender sobre dignidade e respeito, mas daí sofismar que tudo é ruim, ridículo e limitado é uma imprudência sem tamanho. Principalmente num país em que o programa nacional de AIDS é referência no mundo e a política nacional de saúde (SUS) faz, dentre outras coisas, o Obama dizer “this is my man”.

Em relação à taxação de impostos, longe de ser um modelo tributário para o mundo, no entanto, o problema, segundo o Ipea, não está na quantidade de impostos, mas na distribuição da riqueza: para as famílias que recebem até 2 salários mínimos, 48,9% da renda é paga em impostos, por outro lado, para rendas familiares maiores que 15 mil reais/mês, apenas 26,3% são destinados ao tesouro público. Hoje em dia no país, os 10% mais ricos possuem 75% da riqueza nacional, impressionantemente mais do que no século XVIII, que em meio a uma sociedade colonial e escravocrata, os mais ricos levavam 69% do montante. Onde está o tesouro da mamãe?

Quando terminei o Ensino Médio, uma idéia que me martelava à época era o fato de ninguém da minha turma almejar uma carreira de professor do Ensino Infantil ou Fundamental. Em quem poderia estar confiando a educação dos meus futuros filhotes? Numa mesma linha de raciocínio, qual conhecido vem assumindo cargos públicos, quem é esse que vem me representando perante as questões referentes ao meu município, estado e país?

Dinamitar a idéia de se fazer política é destruir nossa capacidade de sonhar, de acreditar em nós mesmos, é manter a deprimente perspectiva de imobilidade dos sistemas econômicos, da desigualdade na distribuição das riquezas. É votar no “nada presta” e eleger o “fica como tá”.

Um comentário:

  1. O cartoon é do mestre Millor Fernandes,para quem quiser espiar seu "saite" http://www2.uol.com.br/millor/

    sobre a taxação de impostos no Brasil recomendo a Carta Capital deste semana (14 de julho)

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